Leva e traz

de Fabíola Tarapanoff em 17 de julho de 2009
Cristina (à frente) e Elisangela, do SBT: benefício criado a partir da mudança da emissora para rodovia Anhanguera

7h30. A analista de RH do SBT, Elisangela Mello, espera tranquilamente pelo ônibus fretado pela empresa para ir trabalhar. Durante o trajeto, que dura cerca de uma hora, ela assiste a um filme e chega à emissora de TV mais relaxada e motivada. “A comodidade é grande. Além de economizar combustível, não me irrito com o trânsito da cidade”, conta. Na volta, ela pega o ônibus às 18h10 e uma hora e meia depois está em casa. “A integração [no ônibus] ocorre naturalmente. Muitas vezes, o happy-hour tem início ali”, brinca.

Para Elisangela, o ônibus fretado faz parte da cultura da empresa e não houve necessidade de fazer uma campanha para que fosse usado. Os benefícios desse transporte, para ela, são claros. No entanto, na cidade de São Paulo esse serviço está com os dias contados. Isso porque uma lei recentemente aprovada irá limitar a circulação desses ônibus em algumas áreas da capital paulista.

Elisangela ressalta que até pessoas que iam de carro para o trabalho, como ela, declinaram ao perceber as vantagens desse serviço. “É bom saber que a companhia se preocupa não só com a nossa segurança, mas que também está atenta às questões de sustentabilidade”, completa.

Uma pesquisa do Instituto Levantamentos e Pesquisas de Marketing (LPM), que entrevistou 500 usuários desse tipo serviço em São Paulo, mostra que apenas um ônibus de fretamento pode retirar até 19 carros das ruas, o que contribui para a redução do trânsito e diminui a emissão de poluentes como dióxido de carbono e enxofre. Outros dados apontam uma situação semelhante: de acordo com a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), de São Paulo, os automóveis são responsáveis por 97% da poluição atmosférica, e um outro levantamento, desta vez da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, da capital paulista, feito há dois anos, revelou que dos 2.121 ônibus fretados vistoriados, só sete foram reprovados – o equivalente a menos de 0,5% da frota.

Atualmente, cerca de 2,5 mil empresas em todo o país usam os serviços de ônibus fretado para transportar seus funcionários. O Sistema Brasileiro de Televisão (SBT) é apenas uma delas.

Até a nova lei entrar em vigor em São Paulo, e nas outras cidades brasileiras em que esse serviço é oferecido (e permitido), o que se percebe é que ele traz algumas vantagens para a empresa e para o trabalhador, conforme conta Silvio Tamelini, presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros por Fretamento do Estado de São Paulo (Fresp).

Estima-se que somente no Estado de São Paulo existam 10 mil veículos de fretamento e no Brasil 4,9 mil empresas são cadastradas junto à Associação Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Seiscentas mil pessoas utilizam o ônibus fretado no país, sendo que 70% desse público é formado por executivos. “Além de ajudarmos a diminuir os congestionamentos, o passageiro que utiliza o fretado tem uma qualidade de vida melhor, pois pode ir lendo ou dormindo, diferente de quem utiliza o carro e se desgasta com o trânsito”, conta Tamelini.

Outra vantagem é a redução de custos. O presidente da Fresp explica que quem utiliza automóvel gasta, em média, 600 reais por mês. Já o funcionário que tem à disposição o serviço fretado tem custo zero, pois a empresa é responsável pelas despesas, que giram em torno de 250 reais por colaborador.

No SBT, o benefício foi implantado em 1989, quando a emissora mudou para a rodovia Anhanguera, próxima à cidade de Osasco, região de difícil acesso para quem não possui veículo próprio. Segundo a gerente de RH da emissora, Cristina Campos, o custo médio por colaborador é de 124 reais por mês para a empresa, que investe 179 mil mensalmente no benefício para garantir que, atualmente, cerca de 1,2 mil colaboradores utilizem-no. São oferecidos 13 trajetos, com tempo médio de uma hora. Os ônibus partem dos bairros Barra Funda (dois trajetos), Tremembé, Sapopemba, Edu Chaves, Metrô Conceição, Cidade Tiradentes, Itaim Paulista, Vila Nilo e Tucuruvi e atende às cidades de Guarulhos, Jundiaí e Santo André.

Além disso, todos os dias, das 5h30 às 23h, ônibus circulam de hora em hora no trajeto Barra Funda-SBT e de 30 em 30 minutos em horários de pico, atendendo a funcionários que trabalham de madrugada e nos fins de semana. Cristina acrescenta que o custo do benefício não é necessariamente menor do que o vale-transporte. “O objetivo sempre foi proporcionar conforto aos colaboradores, contribuindo para uma melhor qualidade de vida”, destaca. E conforto é o que não falta: os ônibus oferecem ar-condicionado, poltronas reclináveis, televisão, DVD, frigobar e toaletes.

Tempo para leitura
Outra empresa que oferece esse benefício é a Totalsys Tecnologia. Há três anos, a companhia concede esse tipo de transporte para garantir praticidade e comodidade aos profissionais que residem em outras cidades. O gestor de RH da empresa, Ewerton Dias, conta que, atualmente, apenas dois funcionários utilizam o benefício: um que mora em São Vicente e outro em Jundiaí (a maioria dos colaboradores reside em São Paulo e vai até a empresa de metrô, já que ela está localizada próxima à estação Santa Cecília).

“O ônibus fretado não sai mais barato do que o vale-transporte, mas no nicho em que atuamos, que é a área de tecnologia da informação, alguns profissionais são muito qualificados e disputados pelo mercado; então, os benefícios também precisam ser personalizados”, explica Dias. E os resultados são percebidos na prática.

Segundo o executivo, foi aplicada recentemente uma pesquisa na empresa que mostra que os colaboradores estão muito satisfeitos com o benefício. “Vir descansando no ônibus, podendo ler revistas e livros de atualização profissional, sem se preocupar com o trânsito, já é um ganho considerável. É gratificante saber que estamos contribuindo para a qualidade de vida dos nossos funcionários e para a melhoria das condições ambientais”, ressalta. O fretado é utilizado também em confraternizações, convenções e eventos externos e a média de custo por colaborador é 400 reais.

Chegar descansado ou desestressado ao trabalho pode significar condições melhores de produtividade. É o que mostra uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), em 2002: uma viagem entre 60 e 80 minutos leva a uma queda de 16% na produtividade, e um trajeto com mais de 80 minutos, a uma diminuição de até 21%. Lembrando que essa viagem deve ser considerada no veículo do colaborador.

“O transporte é o segundo benefício considerado mais importante. Se a empresa não oferecê-lo, a pessoa pode buscar emprego em outro lugar”, analisa Regina Rocha, especialista em turismo rodoviário e diretora executiva da Fresp. Segundo ela, estudos com pessoas que utilizam o transporte público revelam que elas almejam trabalhar na organização quando notam que a companhia possui ônibus fretado para os funcionários. “Elas percebem que a empresa se preocupa com a qualidade de vida de seus profissionais – isso valoriza a marca corporativa”.

Prova da satisfação dos funcionários com o ônibus fretado é um estudo da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP). Quando questionados sobre qual o melhor meio de transporte, 97% citaram o ônibus fretado, 96% o metrô e 95% o táxi. O fretado ficou atrás apenas do automóvel, com 98% de satisfação. Afinal, os veículos apresentam uma boa infraestrutura: ar-condicionado, DVD e até wireless (acesso à internet sem fio).

O RH pode, ainda, solicitar que seja exibido um vídeo de treinamento ou feita a ginástica laboral. Regina ressalta que qualquer solicitação pode ser atendida, como mudança nos horários, e é possível fazer adaptações para atender aos colaboradores que cursam universidade, são portadores de necessidades especiais ou para o deslocamento durante eventos. “Esse é o diferencial do sistema: atender às necessidades de cada companhia”, afirma Regina. Segundo ela, muitos profissionais de RH não utilizam o fretado, pois acham que vai dar trabalho, mas toda a logística é realizada pela empresa contratada”, analisa.

Roleta não é ponto

O trabalho só começa na empresa, e não no ônibus

Uma das principais dúvidas dos profissionais de RH sobre esse benefício refere-se a quando se considera o início do horário de trabalho do colaborador: assim que ele pega o ônibus fretado ou quando chega ao local de trabalho. Regina Rocha, da Fresp, explica que o horário de trabalho só pode ser considerado quando o funcionário efetivamente chegou à empresa.

“Já ouvi reclamações trabalhistas em que colaboradores reivindicaram o período que ficava no ônibus como hora extra, mas não obtiveram êxito na justiça. Trata-se de um benefício que o empregador oferece ao funcionário e não pode se reverter em uma punição para o empregador”, completa.

Compartilhe nas redes sociais!

Enviar por e-mail