Gestão

Liberdade no DNA

de Dum De Lucca em 12 de agosto de 2010

Quem nunca pensou em trabalhar em uma empresa com regras menos rígidas, na qual é possível gerenciar melhor o tempo, suas obrigações e metas, e em que tenha espaço para sugerir ideias e, assim, aproveitar melhor seu potencial? O que antes parecia impossível de acontecer, hoje, já é realidade em muitas companhias que apostam em um modelo de negócios mais liberal, com ambientes livres e descontraídos. A intenção é proporcionar mais recursos para que os colaboradores identifiquem suas aptidões emocionais para, assim, minimizar contratempos e preservar as relações no ambiente de trabalho. Mas como alinhar liberdade com responsabilidade?

A Acesso Digital, empresa de digitalização de documentos, fundada há apenas três anos por Diego Torres Martins, de 26 anos, mostra que isso é possível. A companhia possui um formato próprio de negócios, com estrutura, missão e visão, plano de metas e, acima de tudo, uma gestão baseada no jeito de ser de cada funcionário. “O que eu acreditava, e que se confirmou na prática, é que associar prazer ao trabalho dá mais resultados”, afirma Martins.

Segundo ele, o fato de a empresa ter, também, um perfil próprio de colaboradores, em que a idade média é de 28 anos, contribuiu para que fossem definidas metas individuais muito claras, já que se trata de algo valorizado pela geração Y, que preza muito a transparência. “Um dos grandes motivadores dessa geração é a liberdade – tanto nos horários de trabalho quanto na forma como o funcionário vai desenvolver suas atividades”, acredita Martins. “Trabalhar em casa e acessar mídias sociais não é problema na Acesso.
O importante é cumprir as metas”, acrescenta.

Encantar os clientes e os colaboradores tem a mesma relevância na Acesso Digital. E, segundo Martins, isso é realizado por meio de campanhas internas focadas em metas, que premiam todos os colaboradores – não apenas os da área de vendas – com viagens ao exterior.

Mas, em uma corporação de viés tão moderno, o que pode ocorrer quando um profissional acostumado a um esquema tradicional de trabalho chega para integrar a equipe?  “Aqui não temos esse problema. Isso porque já no processo de seleção, que é formado por um comitê de contratação de áreas diferentes e com a cultura da empresa bem consolidada em mente, conseguimos perceber se a pessoa tem o perfil alinhado aos nossos valores”, explica Martins.

Ele lembra da contratação de uma profissional vinda de uma empresa extremamente rígida, que achou o processo de trabalho da Acesso uma verdadeira bagunça. “Ela estranhou muito a liberdade”, conta. Mas isso não foi problema para a empresa. Em casos como esse, o processo de integração é feito de forma orgânica, naturalmente, para que a pessoa perceba que é uma cultura real. “Até porque a liberdade implica mudança espontânea”, completa Martins, ressaltando que as pessoas que saíram da companhia o fizeram não por falta de adaptação, mas, sim, de resultados.

Limites claros
Mas como fica a questão liberdade e responsabilidade em um ambiente tão descontraído?  Martins dá o exemplo de um jovem de 21 anos que, ao ingressar na Acesso, ficou desnorteado ao encontrar um ambiente com tanta liberdade. “Nesse caso, quando o funcionário fica deslumbrado, a própria equipe o coloca no chão, mostrando os limites”, explica. “Após o período de adaptação – que é de 15 dias -, a pessoa tem de expor para o grupo o que aprendeu nesse tempo. Se a missão e a cultura da empresa não estiverem claras para ela, o processo não é possível. E foi exatamente o que aconteceu com esse rapaz”, lembra Martins. Segundo ele, os profissionais têm de entender que um ambiente livre não significa brincadeira e falta de comprometimento; a boa performance é essencial na integração. “Além disso, a liberdade permite que se enxergue rapidamente como a pessoa é de verdade, já estruturas mais rígidas facilitam a criação de máscaras e personagens dúbios”, ressalta.

Os resultados da empresa mostram que esse modelo de gestão mais aberto tem, sim, razão de ser. Martins acredita que metade do crescimento de 175% no ano passado da empresa, que teve um faturamento de 3,5 milhões de reais, se deva ao modelo de gestão de pessoas adotado. A meta projetada para 2010 é de 8 milhões de reais.

Liberal, porém responsável
Maurício de Almeida Prado, diretor da agência de marketing promocional e eventos Plano 1, fundada em 2001, também aposta na liberdade para gerar resultados e criatividade. Ele conta que a equipe fixa é totalmente integrada, o que permite flexibilidade de horários, tanto de entrada quanto no almoço, e que o método de trabalho se baseia em metas semestrais bonificadas, especialmente na área de criação, que, segundo ele, é o que assegura à empresa um crescimento de 60% ao ano.
Prado afirma ser possível criar mais métodos e processos do que o mercado tem usado por meio de um brainstorm produtivo, de forma focada. Um dos métodos que ele aponta como produtivo é, a partir do briefing do cliente, estimular todos da equipe a anotar ideias e sugerir possíveis soluções. “O aproveitamento desse método é incrível e rico. Fizemos um estudo e o resultado mostrou que mesmo no processo criativo é possível implantar processos. Assim, produzimos todas as etapas dos eventos”, conta o diretor.

Outro ponto que merece destaque na empresa é o fato de as mídias sociais serem totalmente abertas e funcionarem como ferramentas de pesquisa, divulgação e prospecção de clientes, além de comunicação e lazer. “Queremos que nossos colaboradores estejam conectados com o mundo e consideramos muito mais positivo do que negativo o uso do Facebook, Skype e outras ferramentas. Essa forma de gestão, com mais autonomia, delegando responsabilidades e cobrando metas, é muito satisfatória”, enfatiza Prado. Para ele, a forma como a pessoa trabalha torna-se um item secundário. “Ela tem uma meta a cumprir, isso é o que importa”, ressalta. Mas, apesar desse padrão de desburocratizar, motivar e criar pequenos empreendedores dentro da empresa, há sempre pessoas que gostam de receber ordens em um regime rígido, que não valorizam a liberdade e que chegam, até, a pensar que o chefe não conhece a função que ele (colaborador) exerce.

Diante disso, na Plano 1 são feitas dinâmicas e treinamentos sobre liderança moderna para a melhor compreensão do modelo de livre gestão adotado, como explica Prado. “Alguns ficam perdidos, acham que falta liderança, pulso, quando não têm um chefe ditador para mandar. Por isso, fazemos dinâmicas para explicar que o cenário é tão complexo, hoje, que, se a empresa não adotar uma liderança dividida, não anda”, ressalta. Segundo ele, um líder deve integrar e as decisões são tomadas em conjunto. “Quem está acostumado a um sistema de respostas prontas não tem nosso DNA”, alerta o executivo, que gosta de pessoas que saiam da zona de conforto e pensem em soluções e ideias.

Criatividade e inovação
Na Dia Comunicação, agência especializada em ponto de venda, branding e embalagens, e fundada em 1974, também existem casos de pessoas que estranham o modelo de gestão adotado, como conta o o diretor executivo da empresa, Leonardo Lanzetta. Segundo ele, alguns colaboradores ficam impactados com a liberdade de expressão que existe na companhia, na qual a opinião de todos tem a mesma relevância, inclusive a dos estagiários. “Para integrar ainda mais as pessoas, organizamos uma série de dinâmicas que proporcionam uma melhora de clima e um feedback mais rápido dos colaboradores. Tudo isso sem hierarquia, porque todos podem dar uma contribuição para melhorar o trabalho”, diz.

Lanzetta conta que alguns novatos – geralmente vindos de um ambiente rígido – não entendem direito o clima descontraído e extrapolam. “Nesses casos, o próprio grupo mostra que a liberdade está ligada diretamente à responsabilidade.” “Por outro lado”, continua o diretor, “algumas pessoas começam a carreira aqui e quando saem tomam um choque porque perdem espaço para expor suas ideias e pensar”.

Para sustentar os bons resultados (a empresa tem crescido cerca de 35% ao ano), Lanzetta explica que a companhia trabalha enraizada em três pilares básicos: inteligência, criatividade e inovação. Além disso, possui algumas áreas vitais, como criação, gestão de inovação e conhecimento, produção, planejamento e gestão de projetos. Um dos bons resultados obtidos pela área de gestão de inovação e conhecimento, por exemplo, é juntar as inovações em um processo denominado pela empresa de “biblioteca de inovação ativa”. “Esse é um ponto vital de inovação para nós, pois estamos sempre em contato com as novidades do mercado e atualizados. E esse conhecimento circula fortemente nas áreas da empresa”, destaca o executivo. Além disso, toda sexta-feira é dia de motivação na empresa. Uma mesa de frutas para confraternização é montada e, em alguns dias, um DJ escolhido entre a equipe é escalado para uma festa pós-expediente. Segundo o diretor, inteligência é a matéria-prima para a criatividade e, por essa razão, a reinvenção é o cerne do DNA da Dia. “Somente por meio da inteligência e da criatividade é possível chegar à inovação. Portanto, a agência prioriza profissionais que tenham a criatividade e a inovação em seu DNA, características presentes em profissionais da geração Y, por exemplo”, enfatiza Lanzetta. “Nossa cultura é de formar, dar subsídios e trocar conhecimento”, completa.

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