Gestão

Lugar reservado ou cota?

de Rodolfo C. Bonventti em 22 de junho de 2012

No final do governo Luiz Inácio Lula da Silva, o mercado foi surpreendido com a Lei nº 12.353, sancionada e publicada no Diário Oficial da União, em 28 de dezembro de 2010, que tornava obrigatória a participação de representantes dos trabalhadores nos conselhos de administração das empresas públicas ou sociedades de economia mista, bem como suas subsidiárias e controladas ou, ainda, demais empresas em que a União, direta ou indiretamente, detivesse a maioria do capital social com direito a voto. Um avanço nas relações entre empresas e trabalhadores, segundo Regina Valle, gerente de ambiência da área de recursos humanos da Petrobras. “A participação direta de um representante dos trabalhadores nas decisões estratégicas da companhia dá a oportunidade a um importante público de interesse, os empregados, de conhecer a fundo as estratégias da organização, bem como opinar e definir a forma de atuação da empresa, garantindo cada vez mais transparência às suas ações”, esclarece. 

A Petrobras foi uma das primeiras empresas estatais a dar o primeiro passo, que é a realização da eleição, pelos próprios colaboradores, de quem será o seu representante no conselho de administração. Outras organizações como a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), a Eletrosul Centrais Elétricas, a BR Distribuidora e o Banco da Amazônia também já elegeram e empossaram tais representantes. Na maior parte dessas empresas houve a eleição de apenas um nome, exceção para a Chesf, em que foram eleitos um titular e um suplente.

Algumas regras básicas precisam ser seguidas pelos candidatos a esse tão cobiçado cargo. Segundo o advogado Alexandre Magalhães, sócio para a área trabalhista do escritório Chediak e Aragão Advogados, esse representante deve ser escolhido dentre os empregados ativos da empresa pública pelo voto direto de seus pares, em uma eleição que tem de ser organizada pela empresa em conjunto com as respectivas entidades sindicais que os representem. “Ele não terá estabilidade ou garantia de emprego porque, ao contrário do que ocorre com aqueles empregados membros da Cipa [que, por suas ações na defesa de seus pares, podem provocar uma perseguição empresarial], o representante dos trabalhadores junto ao conselho de administração não participará de reuniões que já são consideradas pela lei como conflitantes”, explica. Nesse caso, Magalhães ressalta, a própria segurança do empregado já foi conferida pelo legislador. 

Adriano Vizoni
Heloisa, do IBGC: é essencial investir na capacitação dos representantes, do contrário, estaremos apenas cumprindo uma obrigatoriedade imposta pelo governo

Para Heloisa Bedicks, superintendente geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), essa determinação da lei, que exclui a participação do representante dos trabalhadores em discussões sobre relações sindicais e remunerações, é importantíssima para eliminar possíveis conflitos de interesse. “Esse representante, para poder atuar de forma positiva, tem de estar isento desse tipo de polêmica, porque ali ele deve trabalhar para o bem da empresa, olhando também para os interesses da organização”, esclarece. O mesmo argumento é defendido por Regina, da Petrobras, que acrescenta que o conselho de administração é o órgão encarregado não apenas de auxiliar a diretoria na elaboração das estratégias da companhia, mas também para definir, orientar e supervisionar os executivos na definição dessas estratégias. “Quando há assuntos relacionados à política de recursos humanos no conselho [remuneração, relações sindicais, benefícios e vantagens ou matérias de previdência complementar e assistenciais], nenhum representante da companhia, entenda-se aqui diretores em atividade ou esse representante dos empregados, pode participar das discussões e deliberações para que não fique caracterizado o conflito de interesses”, enfatiza.

Plataforma eleitoral
No recente processo de eleição do conselheiro na Petrobras, finalizado em março, 155 funcionários se inscreveram como candidatos. Na  eleição , a vitória ficou com Silvio Sinedino Pinheiro, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet), que conquistou 53,3% dos votos válidos, representando um total de 14.126 empregados da companhia que votaram no segundo turno dessas eleições. Engenheiro eletricista e analista de sistemas, o funcionário está na Petrobras há 24 anos, hoje atuando na gerência de Tecnologia Geofísica da área de Exploração e Produção. 

Eleito para um mandato de um ano, o profissional acredita que ocupar essa cadeira abre uma grande brecha para que ele possa representar a sociedade brasileira e os seus interesses. “O meu trabalho no conselho de administração será o de representar os anseios de 58 mil petroleiros e cidadãos brasileiros, e eu serei um opositor ao governo, que tem interesses próprios, diferentes dos interesses dos trabalhadores”, afirma. Pinheiro se baseia no fato de que é preciso pensar na Petrobras como uma empresa que serve ao país e que precisa participar ativamente do desenvolvimento dele, a partir de uma visão social. “Vou lutar por mais segurança nas plataformas, por exemplo, por menor incidência de vazamentos e por uma exploração do pré-sal a partir de uma visão que garanta a defesa do povo brasileiro”, completa.

Investimento em capacitação
Experiências parecidas e negativas em algumas empresas privadas, anteriormente, mostraram que o maior problema enfrentado é o despreparo desses representantes para entenderem o papel e a real importância das decisões de um conselho de administração. “Esses representantes sentam-se muitas vezes ao lado de ministros, ex-ministros e de executivos de peso para decidir os rumos de uma grande companhia, e, infelizmente, nem sempre têm o preparo educacional, acadêmico e até mesmo profissional dos demais conselheiros. Por isso mesmo, não conseguem debater e expor suas ideias de igual para igual, e acabam sendo ´´engolidos´´ pelos outros conselheiros”, argumenta a superintendente geral do IBGC.

Segundo Heloisa, é preciso investir cada vez mais na capacitação profissional desses representantes já que, para marcarem boa presença nos conselhos, é condição essencial entenderem de estratégia, do negócio da empresa em que trabalham, do que acontece na economia nacional e também do mercado internacional, que pode afetar a qualquer momento os negócios e o destino daquela companhia e dos empregados que eles representam. “É preciso se preparar muito bem para esse posto e ter formação e conhecimento muito sólidos, do contrário, estaremos apenas cumprindo uma obrigatoriedade imposta pelo governo”, argumenta. Heloisa também se posiciona, particularmente, contra a adoção dessa representação. “É como se fosse apenas mais uma cota imposta pelo governo e que tem de ser cumprida pelas organizações”, desabafa.

Formar o conselheiro
A Universidade Corporativa Petrobras tem tido um papel importante nesse processo, oferecendo um curso específico para os empregados eleitos e indicados para concorrer aos conselhos de administração das empresas em que a companhia tem participação acionária. O curso é realizado pela área de recursos humanos em parceria com a Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e tem como finalidade preparar os novos conselheiros com noções de governança, instrumentos financeiros e estudos de caso do mercado.

Essa preocupação em capacitar os representantes também tem sido sentida com maior força pelo IBGC. Desde 1998, o instituto já capacitou mais de cinco mil profissionais brasileiros em termos de governança corporativa e, nos últimos meses, tem havido uma demanda maior que a oferta por cursos de capacitação e formação de conselheiros de administração, tanto por parte de empresas estatais como privadas. 


Salto estatístico
Do total de candidatos a candidatos, 135 foram habilitados e cumpriam os requisitos básicos para participarem do primeiro turno da eleição, representando 17 sindicatos diferentes. Foram mais de 16 mil eleitores na companhia, que levaram para o segundo turno os candidatos João Antonio de Moraes, coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), e Silvio Sinedino Pinheiro, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet).

 

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