Gestão

Mudança amigável

de Paulo Jebaili em 7 de março de 2014
Rodger Dean Duncan
Rodger Duncan: toda mudança precisa considerar as expectativas dos envolvidos 

Para que sejam bem-sucedidas, as mudanças dependem das pessoas. As alterações, no entanto, mexem com as expectativas e afetam a vida dos indivíduos. Administrar essas variáveis sem que isso se torne um nó para a gestão só é possível por meio do engajamento das pessoas. É o que defende o consultor norte-americano Rodger Dean Duncan, em seu livro Change-Friendly Leadership: How to transform good intentions in great performance (em tradução livre, algo como Liderança da mudança amigável: como transformar boas intenções em grande performance). Jornalista e professor universitário, Duncan trabalha com liderança, gestão de mudança e performance organizacional desde 1972, quando fundou sua consultoria, sediada em Kansas. Na entrevista a seguir, ele explica que mudança amigável nada tem a ver com atitudes paternalistas, mas sim em levar em consideração os sentimentos e as expectativas das pessoas. E explica a abordagem que os gestores devem ter para obter o engajamento delas.

De maneira geral, mudanças tiram as pessoas das zonas de conforto. Como a abordagem amigável pode ser adotada?
A mudança, por si só, não é o que incomoda a maioria das pessoas. O que incomoda é o estresse que vem com a transição de um lugar para outro ou de uma situação para outra. Mesmo as mudanças positivas produzem estresse. Pergunte a qualquer um que tenha planejado se casar. Quando há uma mudança no horizonte, é natural que as pessoas questionem: “O que isso tem a ver comigo?”. Elas querem saber como aquilo irá afetar o trabalho e as relações delas. Querem saber como será a nova situação em comparação com a atual. Apelar para suas cabeças, corações e esperanças é um ótimo modo de ajudar a fazer com que a transição seja não apenas aceitável, mas desejável. É isso que eu chamo de abordagem “amigável”.

O que diferencia a liderança de mudança amigável das demais abordagens, no que diz respeito a engajar as pessoas nesses processos?
Nesse contexto, “amigável” não tem a conotação de afagar ou de ser complacente. E definitivamente não significa uma abordagem que se exima de tratar as questões sérias. A mudança amigável é um protocolo de comportamento que resulta em mudanças bem-sucedidas por levar em consideração os sentimentos e alavancar os dons individuais das pessoas afetadas pela mudança. A liderança da mudança amigável possibilita o engajamento adequado das pessoas cuja adesão é essencial para o sucesso da mudança. Não tem a ver com comando e controle, mas sim com engajamento. O real engajamento é o único caminho para angariar o esforço voluntário das pessoas.

Que comportamentos são esses? Que habilidades um líder da mudança amigável precisa ter para conduzir esse processo?
As habilidades envolvem uma série de comportamentos que eu chamo de Quatro Ts [na sigla em inglês: think, talk, trust e team].
Pensar – Comportamentos amigáveis incluem a capacidade de explorar as novas possibilidades, a curiosidade de fazer perguntas pertinentes, a humildade de mudar suas premissas e o rigor intelectual de fazer “a ligação dos pontos” entre diferentes ideias.
Conversar – Comportamentos amigáveis envolvem renunciar ao seu poder, ouvir com empatia, perguntar para descobrir e argumentar com respeito. Obtemos o melhor quando ouvimos com atenção e as pessoas se sentem à vontade para falar e quando falamos de forma que prestem atenção em nós.
Confiar – Ser confiável tem a ver com comportar-se de modo a construir, manter e expandir confiança. Assim como um computador não funciona bem com um sistema operacional falho, o mesmo se dá com uma organização. Confiança é o sistema operacional da empresa. Confiança frouxa gera desempenho frouxo.
Equipe – Comportamentos amigáveis naturalmente envolvem trabalhar com pessoas de forma a gerar colaboração genuína.

Quais as principais barreiras para se implementar mudanças: as culturais ou as comportamentais?
Ambas, porque cultura tem tudo a ver com comportamento. Todas as políticas formais e procedimentos do mundo não nos fazem melhores se não houver comportamentos adequados. Muitos desses comportamentos vêm à tona na forma de “regras não escritas”. Por exemplo, uma política formal pode pregar que o “trabalho em equipe” é um valor organizacional. Mas se as pessoas na realidade forem competitivas entre si e não interagirem umas com as outras, aquela regra “não escrita” é muito mais poderosa do que a política formal.

Nós precisamos ter muita clareza ao identificar os comportamentos que produzem os nossos resultados. Já foi dito que cada organização precisa estar perfeitamente alinhada para conseguir resultados. Se você não estiver satisfeito com os seus resultados, examine minuciosamente os comportamentos em sua empresa. São os comportamentos que produzem resultados. E esse exame pode demandar o questionamento de alguns comportamentos das lideranças. Alguns líderes, mesmo bem-intencionados, se comportam de modos que produzem resultados não desejados. Isso precisa ser identificado e discutido abertamente.

Em muitos casos, as pessoas resistem à mudança porque ela vem de cima para baixo. O que os gestores podem fazer para evitar esse tipo de situação?
A chave está em praticar o efeito em cascata. Se um esforço de mudança tem um mérito real, valerá a pena ser feito nas camadas intermediárias da organização, não apenas no topo. A mensagem passada com maior nível de credibilidade frequentemente vem do nível “local”. Em outras palavras, as pessoas frequentemente acreditam mais na palavra do seu gestor imediato do que em pronunciamentos do “alto da montanha”. Utilize esse efeito cascata para espalhar essa influência.

Em que aspectos a gestão costuma falhar quando boas intençõesnão se traduzem em boa performance?
Um erro comum é tentar mudar por discurso ou mudar por autoridade. Mesmo se uma mudança for digna de consideração, tentar forçar as pessoas a aceitá-la é algo que nunca funciona.

#L# Com base no modelo que o senhor sugere, de que forma os profissionais de RH poderiam contribuir para um processo de mudança bem-sucedido?
Eles podem dar a formatação explícita dos princípios e práticas de uma boa gestão de mudança, além de continuar treinando as pessoas nas habilidades necessárias para a organização. Tão importante quanto obter sucesso com um esforço específico de mudança é assegurar que a empresa tenha uma capacidade sustentável de produzir mudanças efetivas tantas quanto forem necessárias.

Se o senhor fosse o principal executivo de uma empresa, que tipo de profissional de Recursos Humanos gostaria de ter a seu lado?
Gostaria de ter um profissional de RH cuja orientação fosse além das tradicionais coisas de “pessoal”, como salários e benefícios. Logicamente, essas coisas são importantes, mas são questões transacionais. Eu gostaria de contar com um profissional de RH que também fosse competente nos aspectos transformacionais, que envolvem liderança e influência. Um líder transacional se certifica de que o trem continua nos trilhos. Um líder transformacional se certifica de que o trem está nos trilhos, apontado para a direção correta e que todo mundo que queira fazer a viagem tenha a sua passagem garantida.

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