Por novas perspectivas

de Redação em 27 de janeiro de 2017

A vida é feita de escolhas. Observar o melhor caminho para fazê-las, além das opções óbvias e claras, passa também por desafios externos e paradigmas internos construídos ao longo da vida. Ao tomarmos uma decisão, adotamos como base nossa maneira de ver o mundo, nossa educação, experiências e o ambiente em que crescemos e no qual atuamos. É o que chamamos de modelos mentais, bases preconcebidas que nos ajudam a adotar uma escolha.
Sendo assim, como podemos mudar nosso pensamento se já, presumidamente, o consideramos correto de acordo com nossas experiências? E como fugir da ideia estabelecida e mudar nossos modelos mentais? O mesmo raciocínio se aplica ao pensamento sistêmico e aos modelos mentais existentes dentro das organizações: como lidar com eles e transformar a gestão de pessoas da empresa?
Responder às perguntas acima é a chave para um programa de liderança de sucesso. Em outras palavras, quebrar os modelos mentais dos colaboradores, recriando cenários e novas possibilidades de negócio é um grande desafio ao RH. Esta é uma estrada tortuosa, porém vindoura de acordo com relatos de Luiza Nizoli, presidente da Apdata do Brasil — empresa de tecnologia e softwares.

Pessoas, não robôs
Luiza-Nizoli_Presidente-da-Apdata-do-BrasilLuiza Nizoli conta que há dez anos a companhia passou por esse desafio. A executiva comenta que alguns colaboradores da Apdata mantinham um padrão robotizado de pensamento, repetindo as mesmas crenças e atitudes. “Percebi que esse formato não estava trazendo resultados positivos para a organização. Ele inibia as pessoas ao não despertar a criatividade e limitar a liberdade de expressão e comunicação.” Diante da situação, a decisão foi categórica. “Fizemos uma dinâmica de cima para baixo para reeducar mentalmente os colaboradores.”
Para tanto, foi contratado um coach que trabalhou o problema do ponto de vista emocional. O diagnóstico do profissional foi de que os modelos mentais e crenças conservadoras mantidas pelos colaboradores limitavam o desempenho deles na companhia. Aliada a isso, a crença de sempre seguir a hierarquia como padrão intimidava os funcionários. “Se a empresa continuasse no mesmo molde [de pensamento sistêmico] ela poderia até crescer, mas não teria o salto quântico necessário”, indica Luiza.
Na prática, o coach trabalhou o lado interno (emocional) das pessoas, as crenças e o modo como elas enxergam o mundo. Luiza conta que os colaboradores ficaram chocados com o processo num primeiro momento. “As pessoas se assustaram com a mudança; elas estavam acostumadas com uma filosofia dura, na qual eram conduzidas, direcionadas, nem imaginavam que poderiam ter liberdade. A dificuldade em abraçar essa liberdade foi grande”, diz.

Novos talentos
Passadas as barreiras iniciais do projeto, os ganhos qualitativos e quantitativos foram percebidos. A empresa cresceu 60% em 2012 e o clima organizacional mudou totalmente. “Grandes talentos brotaram na empresa”, afirma a executiva. Para ela, os colaboradores obtiveram uma motivação para ir além. “Promovemos uma revolução emocional tão grande que estagiários [daquela época] hoje ocupam cargos de liderança.”

Mudança pela experiência
Maria-Candida-Alta“Para realizar algo diferente é preciso pensar de forma diferente”, diz Maria Cândida Baumer, diretora da People & Results, especializada em carreira e cultura organizacional. Por isso, num contexto de mudanças organizacionais (principalmente em tempos de crise), é preciso unir a gestão da cultura da organização às mudanças dos modelos mentais dos líderes e gestores.
A especialista garante que para que esse processo se cristalize o colaborador necessita mudar sua crença. “Isso significa experimentar coisas diferentes — por piores que elas sejam — para descobrir novas possibilidades, alternativas. Dessa forma, é possível mudar o modelo mental e a forma de pensar”, observa. Maria Cândida afirma que quanto mais experiências o profissional tiver maiores são as possibilidades de transformar seu modelo mental.
Seguindo esse raciocínio, a executiva ressalta que um RH pode ativar o princípio da andragogia (ciência de orientar adultos a aprender) para facilitar as novas experiências dos líderes e colaboradores. Segundo Maria Cândida, todo tipo de processo educacional baseado na experiência é um caminho importante para obter a mudança de um modelo mental. “O RH pode trabalhar no coletivo, mas também no individual com outras ferramentas como terapia, coaching, programas de imersão para autoconhecimento e processos sabáticos.”

Teimoso
Mas, como mudar o modelo mental de um líder que teima em agir da mesma maneira? Segundo Maria Cândida, nessa hora, a empresa não deve hesitar, é preciso impor a nova maneira de pensar e agir. Ela avalia que, em casos em que os profissionais são acomodados, é preciso um choque de realidade. “Se ainda assim a mudança de modelo mental não ocorrer normalmente, o colaborador deve ser desligado da empresa”, sugere.
Para ela, quanto mais inflexível e rígido às mudanças, menor é a possibilidade de esse profissional se adaptar a um mundo em constante evolução. “O líder que perde a elasticidade em se adaptar às demandas de mercado, contexto e cultura diminui a própria relevância.”

Expressão do aprendizado
Helena-08Por outro lado, Helena Bonetti, sócia-diretora da WePeople – Desenvolvimento Humano e Organizacional, e especialista em desenvolvimento estratégico, sustenta que os modelos mentais garantem as dúvidas sobre as certezas que apoiam nosso conhecimento. “Eles influenciam diretamente o que percebemos, já que estas percepções e juízos podem gerar interpretações, ideias e ações completamente opostas.” Assim, garante Helena, podemos inferir que os modelos mentais influenciam completamente a percepção que temos da realidade. “Ao compreendê-los, criticá-los e substituí-los, quebramos e geramos uma nova ordem das coisas.”
Mas, de que forma isso pode ser aplicado em processos de gestão de pessoas? Helena ressalta que o RH deve se posicionar não como um gestor de pessoas e de conhecimentos, mas como um fomentador de aprendizagens e vivências significativas.
Iniciativas de desenvolvimento baseadas em autoconhecimento, encorajando os colaboradores a dividir seus objetivos individuais com a organização, são fundamentais nesse processo. Dentre essas atividades, a executiva cita alguns exemplos: mesas-redondas para discutir sucessos e fracassos de projetos e ações, sistemas colaborativos de informações e gestão de conhecimento e sistemas meritocráticos baseada em aprendizagem/conhecimento. Essa programação é ótima, contudo, Helena adverte que a capacitação de líderes deve ser sempre uma das prioridades. “Acima de tudo, um grande investimento na formação de líderes capazes de estimular a renovação do conhecimento continuamente”, diz.

Autoconhecimento
Helena é direta ao apontar que o autoconhecimento, a clareza de propósitos e o alinhamento de objetivos e visões (da empresa e do líder) são a base para o exercício de uma liderança. Para ela, essas competências e habilidades devem estar descritas e serem a linha mestra da cultura de gestão da organização. “Se líderes não se conhecem, se não há uma clareza de propósitos da liderança entre suas vidas e carreira, e se diretores não têm uma visão compartilhada do que realmente é importante, torna-se muito difícil consolidar um modelo de líder para uma learning organization — organização que tem a capacidade de aprender, renovar e inovar continuamente.”
“As chamadas learning organizations sugerem uma sociedade de aprendizado continuo, de práticas sistêmicas capazes de gerar valor através da substituição constante do pensamento consolidado, obtendo assim um valor agregado maior”, assegura. Mas, Helena pondera que é importante que esta forma não esteja exclusivamente embasada em práticas e processos de qualquer ordem ou área, que estejam diretamente relacionadas à vocação de seus líderes de construírem e viverem uma cultura organizacional de gestão mais adhocrática (um pensamento oposto à departamentalização).
Isso quer dizer que a diretriz de estratégias da organização deve criar sistemas, procedimentos e regras capazes de estabelecer no negócio práticas de gestão orientada a uma organização mais flexível quanto a procedimentos e métodos; manter na liderança uma baixa aversão ao risco e elevado nível de adaptação de seus membros; ter uma orientação contínua para a mudança e a inovação e vivenciar a falta de autopreservação ou de status quo, além, claro, da valorização e da visão empreendedora de seus membros.
“Numa cultura desta ordem, o negócio de uma organização tende a lucrar não em volume ou por controle, mas pela magnitude, e seu real valor deve se concentrar na capacidade visionária de antever fatos e a de não viver de modelos e ideias do passado com constante renovação”, conclui a executiva.

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