Gestão

Um novo par

de Cristina Morgato em 29 de maio de 2013
Adriano Vizoni
Ana Laura, da Braskem: saber quais são as demandas dos integrantes e entender as necessidades da empresa

Uma missão árdua foi imposta à área de comunicação da Braskem: gerar empatia de seus colaboradores à matéria-prima de seus produtos – o plástico. O objetivo da campanha era criar o sentimento de pertencimento na força de trabalho da empresa petroquímica, responsável pela produção de 16 milhões de toneladas de resinas termoplásticas anuais usadas em objetos como eletrodomésticos, brinquedos e utensílios domésticos. O principal dilema enfrentado era convencer os trabalhadores de que o alvo de muitos ambientalistas é essencial para a sociedade. Para vencer o desafio, a equipe de comunicação elaborou uma estratégia que se mostrou assertiva: investiram na aproximação com o público-alvo. A Braskem convidou os funcionários a participarem da ação, contando, por meio de fotografias, sua relação com o plástico no dia a dia. A mobilização resultou no livro Olhares criativos sobre o plástico, que reuniu as imagens mais criativas (199, das 900 enviadas). O material foi distribuído para os colaboradores que participaram da iniciativa e também ganhou uma versão digital disponível para todos os profissionais da Braskem.

Além da solução adotada para superar esse desafio, outra questão torna esse caso singular: a campanha foi exclusivamente elaborada por comunicadores sem contar com a gerência de recursos humanos. Foi um trabalho arquitetado pela área de comunicação da Braskem com a ajuda de especialistas em endomarketing.  E o que antes era uma exceção à regra tornou-se uma tendência do mercado. De acordo com  estudo  da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje), de 2007 para 2012, caiu de 40% para 25% o número de comunicadores que se reportam aos departamentos de recursos humanos no país. Em 50% das corporações nacionais, o reporte passa a ser direto a profissionais do mesmo segmento de atuação. “Isso indica uma profissionalização crescente do segmento e, ao mesmo tempo, um entendimento das suas especificidades”, explica Paulo Nassar, presidente da Aberje e professor-doutor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP).

Nassar defende que o investimento em comunicação é imprescindível para o bom gerenciamento dos negócios. “Independentemente da hierarquia, hoje, as pessoas em uma empresa precisam se capacitar cada vez mais na comunicação e no que chamamos de relacionamento, porque não existe relacionamento excelente quando não há comunicação excelente. Podemos dizer, assim, que uma empresa que se comunica mal não é uma boa empresa, que o gestor que se comunica mal é um mau gestor, e assim por diante”, explica. Ele acrescenta que é preciso entender que a comunicação interna também não pode ser tratada como uma ilha. É preciso que haja o alinhamento ético, técnico e estético à era da “sociedade da comunicação”, com acesso à informação em tempo real, que se comunica de maneira mais livre e compartilhando as notícias em redes sociais e outros meios instantâneos. “Uma comunicação que é feita dentro do ambiente interno da empresa tem de estar alinhada com o que está acontecendo no mundo”, diz. Segundo o especialista, todas as áreas, inclusive a de recursos humanos, precisam romper com o que se chama de interno e externo. Ou seja, o alinhamento do trabalhador é feito de forma mais global, não existindo uma técnica específica para o que se convenciona chamar de universo da empresa, principalmente em termos comunicacionais. “Não existe o que é belo ou feio para um mundo específico da organização. O que vale para uma empresa vale para o mundo e vice-versa”, completa.

Paradigma contemporâneo
A grande questão em ter ou não uma área especializada em comunicação é que, quando essa função está dentro de RH, muitas vezes ainda não há esse alinhamento contemporâneo. “Principalmente quando se fala desse universo, muitas vezes vemos um enquadramento cínico do empregado. Ele pode dizer que gosta da comunicação que está sendo feita, mas isso não passa de uma forma de se defender em termos das relações pessoais na empresa”, destaca Nassar.

Diferentemente dessa realidade, quando a comunicação ganha espaço e equipes distintos do RH, ela vai se tornando independente, transformando-se em uma área que irá assessorar de forma parceira todos os departamentos e as pessoas da companhia. “É impossível fazer comunicação com os empregados sem trabalhar com informações que só a área de recursos humanos possui. Assim como é impossível o gestor de pessoas fazer comunicação se não trabalhar em uma perspectiva profissional”, define Nassar. Para ele, o RH e todas as demais áreas da organização precisam entender esse novo papel da comunicação. Hoje, trabalhar esse tema no âmbito das empresas é trabalhar não apenas com as relações humanas, mas também com inúmeras questões, que estão ligadas com diversos públicos estratégicos – o sujeito é empregado, é acionista, é comunidade, é autoridade, pertence ao sindicato.

Quando todos esses elementos são respeitados, a comunicação é eficiente. Esse foi o caso da Braskem, que possui uma área de comunicação independente e sob liderança da vice-presidência de relações institucionais. A empresa trabalha com agências de comunicação para apoiar a criação e operacionalização de campanhas e materiais para o público interno, mas a estratégia fica por conta da área especializada. “Estamos cada vez mais presentes no dia a dia das áreas na Braskem. Somos convidados para reuniões estratégicas e temos uma visão generalista, ao mesmo tempo que também é especialista. Sabemos quais são as demandas dos integrantes e também entendemos as necessidades da empresa”, explica Ana Laura de Ornelas Sivieri, atual gerente de marketing institucional (antiga gerente de comunicação corporativa da companhia).

Segundo a executiva, essa é a ponte que aproxima a empresa dos profissionais. De acordo com Ana Laura, o que alavancou a área foram a crescente demanda pela unificação da comunicação e a necessidade de garantir a integração entre as diversas unidades da companhia pelo Brasil. “Desde a fundação da empresa, em 2002, temos nos dedicado a fortalecer a área e, ao longo dos anos, ganhamos força e conquistamos nosso espaço.”  Graças a esse esforço de entender os diferentes públicos e desenvolver estratégias segmentadas, o projeto Nova percepção sobre o plástico virou um case premiado na categoria Comunicação e Relacionamento com o Público Interno, na etapa nacional do Prêmio Aberje de Jornalismo Empresarial. Além disso, a empresa foi a grande vencedora da 38ª edição do prêmio, reconhecida como Empresa do Ano em Comunicação Empresarial.

Mas será que o RH não pode ser um parceiro da área de comunicação? As histórias da Localiza e do Grupo Marista mostram que esse caminho é produtivo. Embora possua uma área de comunicação independente, reportando-se diretamente ao CEO, a Localiza, empresa do segmento de aluguel de carros, mantém uma célula da comunicação corporativa dentro da área de recursos humanos para cuidar de processos específicos do departamento. “A comunicação corporativa sempre foi independente do RH na Localiza, e está no DNA da empresa. Acreditamos que a área deve ter uma participação mais estratégica e global na organização”, explica Priscilla Duarte, gerente de comunicação corporativa da companhia. A área é responsável pelo planejamento, produção e execução da comunicação interna, além de orientar as agências responsáveis pela criação de campanhas de endomarketing.

No caso do grupo educacional Marista, a comunicação interna ganha ainda mais relevâncias operacional e estratégica, uma vez que precisa integrar 15 mil colaboradores em mais de 80 unidades espalhadas pelos estados do Paraná, Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás, além do Distrito Federal. Do ponto de vista operacional, a responsabilidade da comunicação interna ainda está a cargo da área de recursos humanos (mais especificamente, da diretoria corporativa de gestão de talentos). Porém, o grupo implementou uma assessoria de comunicação para garantir o alinhamento estratégico e institucional de todos os processos de comunicação. “A área surgiu em 2007, como resposta à demanda derivada de nossa atuação capilarizada, multissetorial, e, naquele momento, ainda sob um modelo de governança e gestão descentralizado”, conta Leandro Frederico de Bastos Martins, diretor da assessoria de comunicação do Grupo Marista.

Comunicar para engajar
O principal objetivo da comunicação corporativa na Localiza é contribuir para que a companhia seja admirada. Para isso, trabalha não só para divulgar as informações relevantes, mas também para gerar orgulho nos colaboradores pelas conquistas, estabelecer e reforçar padrões, além de disseminar valores, motivar e engajar pessoas e garantir a consistência na comunicação no grupo. “Investir em uma comunicação transparente, ágil e consistente faz parte da nossa estratégia para fortalecer a imagem da companhia e refletir sua cultura. E o público interno percebe positivamente os esforços e papel da comunicação nesse sentido”, garante Priscilla. Prova disso, segundo a gerente, é que os colaboradores colocam a comunicação interna como um dos quatro principais itens que mais impactam o engajamento (segundo informações de recente pesquisa realizada pela Aon Hewitt). Foi utilizando a comunicação como ferramenta estratégica e acreditando em seu poder no envolvimento das equipes que a Localiza conquistou o prêmio Aberje 2012, na categoria Comunicação e Relacionamento com o Público Interno (região Minas Gerais e Centro-Oeste).

O case  premiado comprovou a eficiência do novo modelo de avaliação comportamental, que reúne dez competências, oito delas comuns a todos os colaboradores e duas exclusivas para os líderes. A campanha tinha como objetivo transformar um tema árido e complexo em uma abordagem lúdica e simples, acessível a todos os colaboradores da Plataforma de Negócios Localiza. “O caminho foi convidá-los para uma viagem cuja bagagem eram o conhecimento e a experiência, que os levariam cada vez mais longe”, conta Priscilla, que comemora o alcance dos objetivos traçados.

Alinhamento de cultura
Martins, do Grupo Marista, explica que, no início de 2012, após mais de três anos de planejamento e pesquisas internas e externas, a área liderou o  projeto  de reformulação da arquitetura de marcas do Grupo. “A partir desse movimento, o alinhamento estratégico da comunicação interna ganhou ainda mais relevância, exigindo que todos os colaboradores compreendessem de maneira mais ampla, assertiva e – especialmente – engajada a razão de ser da nossa marca”, conta. O grupo atua com agências contratadas para a operação da comunicação interna, o que envolve criação e produção de peças e materiais de comunicação, além de possuir colaboradores terceirizados para a produção de publicações e da rádio corporativa. “As etapas de planejamento que ficam a cargo da equipe interna ocorrem, como é típico de nossa cultura corporativa, de maneira coletiva e colaborativa”, diz Martins. Um trabalho intenso de pesquisa, focus groups, análises e validação com lideranças, implantação e divulgação resultou na conquista do Prêmio Aberje na categoria Comunicação e Relacionamento com o Público Interno, entre outros prêmios na etapa da região Sul.

O diretor conta que a área de comunicação vem crescendo significativamente em importância desde sua concepção. No entanto, foi em 2012, com o lançamento desse projeto, que consolidou sua atuação e reconhecimento entre os colaboradores, tornando-se uma área diretamente ligada à superintendência executiva do Grupo. Mas Martins acredita que ainda existem enormes desafios a serem vencidos. “Entendemos que a relevância estratégica da área deriva diretamente da essência de nossa missão, que alimenta nossa marca e gerencia as relações com os nossos diversos stakeholders. No entanto, entendemos também que todos esses pontos nascem necessariamente a partir da realidade vivenciada na organização, em primeiro lugar pelos responsáveis por sua operação”, ressalta.  Apesar das barreiras, já há grandes batalhas sendo vencidas no front da comunicação interna e se tomarmos o exemplo de países como os EUA, a tendência é que a área precise cada vez mais de profissionais especializados no tema.



Inteligência x operação
O levantamento da Associação Brasileira de Comunicação Empresarial (Aberje) mostra que 34% das 179 empresas ouvidas já possuem diretorias de comunicação. A maioria das companhias tem de 3 a 5 pessoas trabalhando nessa área. Além disso, 64% contam com equipes internas e terceirizadas para tocar os projetos do setor. Na prática, os profissionais que trabalham nas organizações tendem cada vez mais a lidar com a estratégia e a inteligência dos processos, terceirizando a execução dos trabalhos, as ações de comunicação em si. “Embora a cadeia de fornecedores também venha investindo bastante em inteligência, essa questão envolve o fato de as áreas de comunicação estarem envolvidas com a concepção das políticas organizacionais e dos planejamentos. A terceirização da inteligência comunicacional pode ser mortal para as empresas”, complementa Paulo Nassar, da Aberje. Veja mais alguns dados do estudo:

Mulheres no topo das áreas de comunicação
Em relação a 2007, houve uma evolução da mulher no campo profissional – elas ocupam, hoje, 74% das posições de liderança indicadas na pesquisa.

Sangue novo
Dos participantes, 58% têm idade entre 25 e 40 anos. Desses, 66% ocupam posições de liderança em suas organizações (diretor, gerente, chefe ou coordenador).

 

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