Uma luz no alto do prédio

de Por Vanderlei Abreu em 17 de junho de 2011

Em parceria com o Centro de Políticas Sociais (CPS) da Fundação Getulio Vargas no Rio de Janeiro, o Instituto Votorantim apresentou, recentemente, a pesquisa Trabalho, educação e juventude na construção civil . O estudo traça um panorama dos desafios desse setor, relacionando-os ao perfil dos trabalhadores e apontando caminhos para os jovens quanto às oportunidades de inserção qualificada no mercado.

O apagão de mão de obra, questão central para os atuais desafios de desenvolvimento do país, se coloca, na pesquisa, sob uma nova ótica: como o setor da construção civil pode se aprimorar, em relação ao uso de tecnologias e melhoria das condições de trabalho, de forma a atrair e reter a mão de obra jovem?

O levantamento traz à tona uma questão-chave para o Brasil: o aumento da demanda e a prosperidade na construção civil, relacionados aos eventos esportivos e às obras de programas governamentais versus a dificuldade do setor para atrair e reter profissionais. O estudo parte da valorização da educação como elemento fundamental e agrega análises e ferramentas de simulação, que apontam caminhos de melhoria para o setor e para os jovens trabalhadores que buscam uma inserção nesse mercado.

Apesar do aumento da escolaridade e dos salários, o levantamento mostra que há maior escassez de mão de obra na construção. E a tendência seria de um acirramento desse apagão. Segundo dados do estudo, apenas 17,8% dos ocupados na construção frequentaram curso de educação profissional. E, considerando os três níveis de formação – qualificação profissional, curso técnico e graduação tecnológica -, dos 16 setores avaliados, a construção civil apresenta-se da seguinte maneira:

  •  14º lugar em qualificação profissional
  •  também é o 14º, dos 16 setores, em cursos técnicos
  • em graduação tecnológica, ocupa a 13ª posição

Apesar da baixa qualificação profissional, o estudo aponta a volta da prosperidade ao setor da construção civil, depois de décadas de estagnação. A retomada está relacionada com a emergência da nova classe média brasileira e a existência de um alto déficit habitacional. Além disso, eventos internacionais, como a Copa do Mundo e a Olimpíada, além de programas governamentais, como o Minha Casa, Minha Vida e as obras de infraestrutura do PAC, também têm aumentado a demanda no setor.

Nesse cenário, o levantamento questiona a extensão desse apagão de mão de obra na construção civil pela evolução de salários, da jornada e da ocupação. Outro ponto do estudo relaciona essa escassez à baixa escolarização do brasileiro. A opção dos jovens por trabalhos menos braçais também é colocada em xeque: dos 29 milhões de jovens ocupados, apenas 2 milhões estão dedicados ao setor da construção civil. Por outro lado, a pesquisa aponta uma crescente valorização da mulher no segmento, cuja renda individual média é três vezes maior que a do homem, justamente pela maior escolaridade, já que elas ocupam cargos mais qualificados, como engenheiras e arquitetas.

O levantamento aponta três caminhos para que as empresas do setor possam atrair cada vez mais essa mão de obra jovem. Um deles é o desenvolvimento de tecnologias que reduzam a necessidade do trabalho braçal; outro é o aumento dos salários determinado pela demanda do mercado; já o terceiro refere-se à capacitação, mais precisamente, lançar mão dos cursos de qualificação.

Mão na massa
Nesse aspecto, algumas companhias desse setor já estão com a mão na massa. É o caso da Viapol, que atua no mercado de impermeabilizantes e no desenvolvimento de soluções para o setor da construção civil e diversos segmentos industriais. Ela, além de preparar a mão de obra, ainda aproveita seus programas de qualificação para reforçar o uso consciente dos impermeabilizantes.

Para tanto, a empresa mantém um amplo cardápio de cursos, dirigidos aos profissionais da construção civil e também a varejistas, representantes, distribuidores e consumidores finais. São palestras, treinamentos, curso de formação de mão de obra e demonstrações de produtos que visam levar informações sobre os itens fabricados pela empresa, suas aplicações e benefícios.

Somente em 2010, foram realizados 305 eventos pela Viapol, em diversos estados brasileiros, com a participação de 2.284 pessoas. Os encontros ocorrem durante todo o ano e são realizados por especialistas do departamento técnico e de especificação da empresa, que desenvolve também manuais técnicos, folhetos, gibis e material de apoio às vendas, com o objetivo de auxiliar os profissionais do setor a conhecerem e especificarem os produtos corretos para cada necessidade, de acordo com suas características.

Participam dos eventos engenheiros, aplicadores, balconistas e vendedores, estudantes e profissionais de órgãos públicos e privados. Os treinamentos, palestras e demonstrações de produtos ocorrem em revendas de material de construção e de produtos especializados, em escolas e universidades, entidades, construtoras e na unidade fabril da Viapol localizada em Caçapava (SP), onde são realizados os cursos de Formação de Mão de Obra (FMO).

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Com temas diversificados, como produtos químicos para construção e mantas asfálticas, os cursos FMO – que também são realizados in loco , conforme a solicitação dos clientes – têm por objetivo difundir a correta utilização dos sistemas de impermeabilização. Dirigidos aos profissionais de mão de obra direta da construção civil, como pedreiros, encanadores, telhadistas, pintores, entre outros, os cursos possuem duração de um dia (dois períodos de quatro horas), contam com parte teórica e prática e são totalmente gratuitos.

O gerente de marketing da Viapol, Henrique Setti, destaca que o uso consciente dos impermeabilizantes é um processo que está no começo. “Embora, atualmente, profissionais e consumidores finais tenham mais conhecimento sobre a importância desses produtos nas edificações, ainda há muito a ser difundido”, afirma. Daí a necessidade de um amplo processo educativo sobre a impermeabilização e seus benefícios voltado a profissionais do setor, desde engenheiros até os vendedores, balconistas e aplicadores. “Existe a necessidade de atuar em toda a cadeia de valor. Nos cursos superiores de engenharia e arquitetura, há uma enorme carência de informação, pois não existe, em geral, uma disciplina específica voltada ao tema, apenas uma abordagem rápida sobre o assunto. Aos aplicadores (mão de obra), também falta formação sistemática, principalmente, em instituições de ensino dirigidas a esta categoria profissional”, destaca Setti.

As próprias construtoras também têm avançado na adoção de estratégias de formação, atração e retenção de mão de obra. A paulista Rossi criou, no ano passado, um programa de incentivo aos colaboradores para indicação de profissionais para as vagas em aberto, denominado Profissional Amigo. Qualquer funcionário pode indicar um amigo ou até parente para trabalhar na empresa e ganha um vale-prêmio no valor de 150 reais caso a pessoa apresentada seja contratada.

Renata Rossi, diretora administrativa da construtora, ressalta que a prioridade de preenchimento das vagas é dada ao recrutamento interno, por meio de promoções ou transferências, mas comemora os resultados do Profissional Amigo. “Desde a criação do programa, recebemos 200 indicações e contratamos 53 profissionais, sendo 23 para a área administrativa e 30 para os canteiros de obras, ou seja, um aproveitamento de 25%.” A Rossi também busca profissionais em cursos de capacitação oferecidos pelo Senac, Sesi e em oficinas de qualificação como a Escola do Bom Pedreiro e a Escola do Armador de Estruturas.

A oferta de possibilidades de desenvolvimento de carreira também é uma das estratégias utilizadas pelas companhias do setor para reter seus talentos. A Academia Rossi tem um programa chamado Escola da Engenharia com uma série de treinamentos para engenheiros, mestres de obras e pessoal administrativo, mas também oferece oportunidades para serventes e pedreiros. “Em nossa pesquisa de clima, que chamamos ´´Opinião que Transforma´´, feita em novembro de 2010, de 950 respondentes, 60% disseram que o motivo que os faz permanecer na Rossi foram as oportunidades de crescimento e desenvolvimento profissional”, destaca Renata.

Para reter talentos
A construtora gaúcha Rotta Ely também aposta no treinamento como ferramenta de retenção de profissionais. Segundo Thiago Rotta Ely, diretor de novos negócios, a empresa tem se baseado em dois pilares de sua política de gestão de pessoas: desenvolvimento profissional, oferecendo treinamento e capacitação; e gestão do conhecimento, por meio de estímulo e geração de feedback constante por parte da gerência. “Os gerentes estão sempre próximos do pessoal operacional”, ressalta. Ely comenta que uma prática comum na construtora é a capacitação técnica, feita nos próprios canteiros de obras por meio de procedimentos, instruções técnicas e execução operacional, bem como orientação sobre segurança e medicina do trabalho. “Custa menos investir em segurança do que tratar o funcionário acidentado, além do fato de que a produtividade do profissional está diretamente ligada à qualidade do ambiente em que ele trabalha”, atesta.

A boa reputação da empresa, como estar presente em premiações como as melhores empresas para trabalhar, do Great Place to Work, também começa a ser prática corrente entre as principais empresas do setor da construção civil. Com 15 anos de atuação no mercado gaúcho, a Rotta Ely vem trabalhando constantemente o posicionamento de sua marca como uma empresa voltada para tendências, inovação e desenvolvimento de novos produtos. “Isso tem feito com que muitos profissionais venham buscar oportunidades na construtora, bem como temos recebido indicações de funcionários e utilizamos outras formas de recrutamento”, detalha Ely, diretor de novos negócios.

A Rossi também tem se beneficiado da sua reputação no mercado para ser referência na atração de profissionais. “A empresa, pelo seu porte, pelos seus programas, tem uma boa atratividade em relação ao mercado, e também temos políticas de remuneração e desenvolvimento capazes de reter as pessoas”, afirma Renata Rossi, diretora administrativa.

Evolução sentida no bolso
Renda individual média no setor de construção civil
Sexo
1998
1999
2001
2002
2003
2004
Homem
880,72
788,85
779,30
798,90
734,12
722,67
Mulher
656,09
647,72
850,34
1.359,53
811,78
1.201,35
Sexo
2005
2006
2007
2008
2009
 
Homem
786,05
807,81
856,40
875,18
891,02
 
Mulher
1.102,35
1.700,06
1.184,52
1.336,13
2.155,29
 

 

Trabalho pesado não atrai
Confira outros dados da pesquisa feita pelo Instituto Votorantim, em parceria com o Centro de Políticas Sociais da FGV
29,24% O número de trabalhadores na construção civil na faixa etária entre 15 e 29 anos caiu de 36,49% em 1996 para 29,24% em 2009, de acordo com o levantamento.

8,06 anos No que se refere ao tempo de escolaridade dos trabalhadores com idade entre 20 e 24 anos, ele passou de 4,91 anos em 1996 para 8,06 anos em 2009. Já entre os trabalhadores com idades entre 20 e 25 anos, o índice foi de 4,89 para 7,54 anos no mesmo período.

36,20% No que se refere à melhoria de vida dos trabalhadores do setor: em 1996, 51,28% das famílias dos profissionais dedicados à construção civil estavam nas classes D ou E (renda familiar inferior a 1,1 mil reais). Em 2009, apenas 36,2% representavam as classes D ou E, o que reflete uma ascensão para a classe C.


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