Gestão

Acelerador de conhecimentos

de Donald A. Marchand* em 7 de janeiro de 2010

O que aconteceu no primeiro trilionésimo de segundo após o Big Bang? Como foi criada a matéria? Existem mundos paralelos? No ano passado, cientistas esperavam que a maior experiência científica do mundo – o projeto Large Hadron Collider (LHC, em português: Grande Colisor de Hádrons) – iria responder estas e outras perguntas a respeito da natureza do nosso universo. Infelizmente, o acelerador de partículas, de 27 quilômetros de comprimento, funcionou apenas durante 10 dias devido a uma falha que o inutilizou por mais de um ano. Mas do ponto de vista acadêmico empreendedor, o projeto já é um estudo de caso fascinante. Ao examinar a maneira com que 169 países, 37 instituições de financiamento e 2,5 mil cientistas trabalharam para construir Atlas, um dos quatro detectores de partículas do LHC, temos insights sobre os benefícios e características da bem-sucedida liderança por meio da colaboração.

A construção do Atlas – uma máquina extremamente sensível e precisa, com metade do tamanho de Notre Dame, em Paris, e tão pesado quanto a Torre Eiffel – foi, sem dúvida, um projeto de enormes proporções. A visão tradicional de tais iniciativas é a de que são conduzidas por líderes carismáticos e autoritários que exercem controle sobre todos os aspectos de um projeto ao longo de seu ciclo de vida. Em muitos casos, isso continua sendo verdadeiro, porém há uma crescente conscientização de que a reunião de ideias, recursos e esforços dos envolvidos superem as realizações de qualquer indivíduo.

Os institutos de pesquisa e agências de financiamento por trás do Atlas financiaram seus próprios cientistas nacionais. Se qualquer membro da colaboração se afastasse do projeto, sua verba particular iria junto. Outro desafio eram as reputações de todos os cientistas envolvidos, sendo tratados como estrelas por suas instituições. Sendo assim, a colaboração não foi algo dado – teve de ser construída.

Em vez de realizar uma abordagem confrontadora, ao estilo anglo-saxão, os colaboradores dialogaram a respeito das áreas dificultosas até entrarem em consenso. Para manter a colaboração harmoniosa, ajustes e acordos tecnológicos eram tolerados, sem comprometer a qualidade. Isso mudou a maneira como as decisões eram tomadas e resultou em perda de eficiência em custos e processos. Porém, as diretrizes afetando o funcionamento da colaboração e da máquina não foram prejudicadas.

Liderar pelo incentivo
Em vez de líderes que atuam de cima para baixo, a equipe de gestão do Atlas se comportou como administradora; seu papel era o de canalizar a criatividade dos cientistas. Isto é, novas ideias sempre eram incentivadas, já que a criatividade surge de debates e da partilha de conhecimentos. Quem via de fora as interações dos cientistas podia pensar que passavam a maior parte do tempo em reuniões. No entanto, eles estavam trabalhando em conjunto, confiando nas aptidões e competência de cada um para desenvolver as soluções necessárias para cada estágio evolutivo do projeto.

Um dos pontos principais da colaboração científica foi a transparência de toda documentação e reuniões. Equipes “concorrentes” podiam mesclar dados, adquirindo conhecimento para desenvolver suas próprias soluções e oferecendo feedback sobre as propostas dos colegas. Assim, podiam apresentar seu trabalho à comunidade, formando um ciclo contínuo. Essa abordagem melhorou o conhecimento compartilhado do grupo, criando camaradagem e apreciação por outros membros da colaboração. Trabalhar com colegas estimados tornou-se um forte condutor da colaboração.

Os gerentes do projeto também garantiram que os cientistas cujas ideias não eram aproveitadas também pudessem contribuir. Ou seja, deixar de propor a melhor solução não refletia negativamente sobre a capacidade de uma equipe ou um indivíduo.

Administrar riscos
Uma regra de ouro na evolução do projeto foi “não apressar as decisões”. Por quê? Para gerenciar o risco. O ambiente tecnológico altamente incerto exigiu uma gestão de riscos cuidadosa. Tradicionalmente, gerentes de projeto tentam identificar todos os riscos futuros da empreitada e quais medidas devem tomar para reduzir ou eliminá-los enquanto o projeto ainda está em fase de concepção. Essa abordagem é baseada na lógica de que o futuro pode ser previsto com precisão e que imprevistos são exceção, não regra. Porém, a equipe Atlas tomou um rumo totalmente diferente: evitou riscos ao esperar até o último momento possível para tomar decisões. Isso retardou o processo, mas, juntamente com os trabalhos em curso, permitiu que colaboradores evitassem o risco em vez de administrá-lo após sua manifestação. Enquanto a máquina é ligada novamente, o mundo estará de olho para ver quanto conhecimento pode ser adquirido por meio do poder desta colaboração científica sem precedentes.

*Donald A. Marchand é professor of strategy execution and information management no IMD. Ele leciona nos programas Mastering Technology Enterprise (MTE), Managing the Global Supply Chain (MGSC) e Orchestrating Winning Performance (OWP), assim como no Partnership Programs do IMD. Este artigo é baseado em um estudo de caso de Marchand e o assistente de pesquisa Philippe Margery e é o único no mundo a respeito do projeto Atlas do CERN.

Compartilhe nas redes sociais!

Enviar por e-mail