Para Christine Naschberger, cultura depende muito da interação presencial das pessoas
Entrevista

Como fica a cultura organizacional no home office

Para professora, as culturas organizacionais também foram “confinadas” durante o período de confinamento

Professora de gestão e de gestão de RH da Audencia Business School, na França, Christine Naschberger até compreende as iniciativas de confraternização de uma empresa a distância. Fazer happy hours ou cafés da manhã virtuais, para ela, no entanto e por exemplo, nada mais é do que uma ação mais “cosmética” do que eficaz para fomentar a cultura de uma empresa e gerar um sentimento de pertencimento. E para as empresas que, a exemplo do Facebook e do Twitter que anunciaram recentemente que seus funcionários poderão continuar trabalhando de casa, ela questiona: quais as consequências para o bem-estar físico e psicológico dessas pessoas? Quais são as consequências para a cultura organizacional e para o coletivo?

O ambiente de trabalho é um reflexo da cultura da empresa. Seja a decoração, os tipos de móveis, o dress code, são vários os aspectos que transmitem e reforçam a cultura da companhia, seus valores e propósito. Com a pandemia, porém, em muitas empresas, boa parte da mão de obra, ou toda, passou a adotar o home office. Como fica cuidar da cultura a distância sem a ajuda do ambiente físico?

Os desafios da cultura organizacional durante uma pandemia dependem do setor e também da atividade da empresa. Se os funcionários trabalham em casa, não há mais cultura organizacional. Uma cultura organizacional abrange os valores transmitidos, os comportamentos e as interações entre os funcionários. Na minha opinião, as interações virtuais durante o confinamento entre os funcionários são superficiais demais para criar um sentimento de pertencimento. As culturas organizacionais também foram “confinadas” durante o período de confinamento. Além disso, a geração jovem, tão hábil em novas tecnologias, rejeitou o home office com mais força durante o período de confinamento. Os jovens se sentem isolados, sozinhos, mal supervisionados e esquecidos na frente da tela. O maior desafio para as empresas que optaram pelo trabalho remoto é fazer reviver a cultura após o retorno dos funcionários. Será necessário criar momentos de compartilhamento, troca ou convívio para que a cultura possa emergir novamente. O contato humano é fundamental para despertar culturas adormecidas durante a pandemia.

Para dar vida a uma cultura corporativa, são necessárias interações entre indivíduos. A tela não substitui o contato humano de jeito nenhum

Com muita gente trabalhando remotamente, como manter a cultura viva, os valores em dia?

Não acredito que isso seja possível. Para dar vida a uma cultura corporativa, são necessárias interações entre indivíduos. A tela não substitui o contato humano de jeito nenhum. É claro que podemos organizar um café da manhã com a equipe pelo Zoom, happy hour virtual entre colegas, mas nada supera as discussões reais, olho no olho. Para mim, esse tipo de ações são “cosméticas” e superficiais para manter artificialmente o vínculo.

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Quando se vai para o escritório ou fábrica, temos sinais concretos da cultura (móveis, decoração, espaços físicos). E agora?

Sim, uma cultura corporativa é composta por valores formais e informais, comportamentos e interações entre indivíduos e também artefatos como o logotipo, o slogan, a organização dos espaços etc. Durante as reuniões virtuais, pode-se colocar na tela do computador uma imagem “corporativa”, por exemplo, o logotipo ou uma foto das instalações de sua empresa. Qualquer que seja a localização geográfica de um funcionário, ele pode realizar uma reunião virtual mostrando a infraestrutura da empresa. Eu insisto, para mim, essa ação também é “cosmética”.

As interações virtuais durante o confinamento entre os funcionários são superficiais demais para criar um sentimento de pertencimento

Como garantir que todos fiquem integrados, conectados e engajados, mesmo a distância; quais os desafios e caminhos?

Na minha opinião, é quase impossível garantir que todos estejam integrados, conectados e envolvidos, a menos que o departamento de TI controle as conexões etc. Mas estar conectado no computador não quer dizer estar conectado emocionalmente, não diz nada sobre o estado de conexão do indivíduo. Um funcionário pode fingir estar conectado, mas, na realidade, está desmotivado e emocionalmente desconectado. Muitos funcionários perdem a concentração durante as inúmeras reuniões virtuais. É difícil manter o foco e a motivação olhando o dia todo para uma tela de computador. O trabalho remoto é bom, mas trabalhar o tempo todo ou sua vida toda em home office é outra coisa. Empresas como Facebook e Twitter anunciaram que parte dos seus funcionários poderiam continuar trabalhando em home office por toda a vida! Quais as consequências para o bem-estar físico e psicológico desses funcionários? Quais são as consequências para a cultura organizacional e o coletivo? Se for essa opção, existem, claro, ferramentas: podem realizar pesquisas (barômetro de RH, pesquisa sobre bem-estar e organização do trabalho, pesquisa sobre comunicação interna) para entender melhor as percepções dos funcionários. Após os resultados, o RH ou a equipe de comunicação pode definir ações para melhorar as condições de trabalho dos funcionários ou melhorar os dispositivos de comunicação. Hoje, estamos enfrentando desafios cruciais em relação à comunicação. Os funcionários são inundados com informações e alguns também podem perder o foco porque há informação demais. Muitas vezes, não sabemos mais onde procurar informações, especialmente quando os canais de informação e comunicação estão se multiplicando. As redes sociais corporativas, como o Workplace, são fontes de informações e ferramentas de comunicação geniais, mas também são uma fonte de estresse para os funcionários que têm medo de “perder” as informações e serem mal informados. Não é fácil para os departamentos de comunicação encontrar a combinação certa e o equilíbrio.

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