Gestão

Não é só falar…

de Jacqueline Sobral em 27 de julho de 2015
Cada interrupção, como um “plin” que acusa uma nova mensagem no WhatsApp, faz com que nosso cérebro demore em média 23 minutos para voltar a se concentrar no que estava fazendo

Sabe o que todos nós temos em comum? As 24 horas do dia. Na prática, porém, a impressão é que o tempo é cada vez mais curto para cumprir todos os compromissos, entregar projetos no prazo, investir no networking com colegas do trabalho, ouvir atentamente o que o cliente tem a dizer, pensar de forma estratégica sem perder o timing das tarefas rotineiras do cotidiano e ainda conseguir pensar de forma criativa, mesmo no meio desse turbilhão de “coisas a fazer”, que o convidam a querer automatizar o máximo possível de ações. Isso sem levar em consideração que não somos máquinas (ou já nos tornamos?): precisamos ter vida pessoal, praticar exercícios físicos, dormir pelo menos sete horas por noite, manter uma alimentação saudável, adquirir novos conhecimentos, dar atenção à família e amigos e… ainda “ser feliz”, porque a pressão para deixar a tristeza de lado, inclusive em função da agenda apertada, é grande também.

Nesse nosso imenso mundo contemporâneo, interligado pela tecnologia móvel que, em vez de nos trazer praticidade, só tornou mais tênue a linha que separa o lazer do trabalho, é notável o fato de termos mais meios de comunicação e, na mesma proporção, menos êxito em de fato dialogar com o outro.

Disputa de talentos

No ambiente corporativo, o problema só cresce. Estamos sempre ouvindo falar sobre a disputa das empresas pelos melhores talentos, certo? A falta de comunicação já começa nessa busca. E não estou nem citando a dificuldade que muitas organizações têm de explicar ao mercado as competências e os perfis de profissionais que procuram para preencher suas vagas. Uma pesquisa realizada nos EUA e divulgada em maio pela consultoria Career Builder concluiu que, em processos de recrutamento e seleção, enquanto 84% dos candidatos a empregos esperam alguma resposta, ainda que negativa, sobre uma vaga para a qual se inscreveram, apenas 52% dos empregadores retornam a menos da metade deles. Ao serem omissas, as organizações não apenas estão construindo uma imagem negativa junto a esses profissionais que, no futuro, poderiam ser contratados, como também estão perdendo consumidores, pois, segundo o estudo, quase 70% dos candidatos que não receberam retorno tendem a não comprar mais produtos e serviços de tais empresas.

Os livros de administração e de gestão de pessoas estão repletos de ensinamentos que parecem óbvios. Se as empresas querem não somente profissionais comprometidos, mas de fato engajados, ou seja, envolvidos emocionalmente com o seu trabalho, o primeiro passo é explicar o que se espera deles, quais são as “regras do jogo”; resultados satisfatórios só são alcançados quando toda a equipe compreende o papel e as responsabilidades de cada um. Saber o que motiva o funcionário a fazer parte do time e quais são as suas dificuldades e angústias também é parte fundamental do processo. É preciso superar de vez a visão do “homem máquina” do modelo racional que predominou na época da consolidação do processo de industrialização na Europa, no início do século 20, segundo a qual o único incentivo do empregado para trabalhar é o retorno financeiro. Claro que as pessoas querem ganhar bem pelo que fazem, mas essa não é a única razão. Os profissionais querem saber por que estão fazendo determinadas tarefas, que objetivos o empregador quer alcançar e serem informados se estão no caminho certo. Como fazer isso? Usando a comunicação.

A questão é que nesse nosso mundo de “simulacros”, ou seja, de experiências, digitalidades e virtualidades sem referências, que se apresentam mais reais do que a própria realidade, como defende Baudrillard, ninguém tem tempo de dar atenção ao outro, ou de compartilhar informações relevantes com o colega do lado, não é mesmo?  O importante é estarmos as 24 horas do dia conectados às telas dos smartphones, tablets e computadores, máquinas que já se tornaram extensão do homem, como já previa o canadense Marshall Mc Luhan nos anos 1960. “Posto, logo existo”, diz a máxima atual.

Retrabalho

Enquanto isso, empresas sofrem com altos índices de retrabalho, já que departamentos não falam entre si; têm problemas diários com clientes por falta de integração entre os canais de atendimento; e criam avaliações de desempenho que não passam de processos formais que não correspondem à realidade, pois o gestor está muito ocupado para prestar atenção em cada um dos membros da sua equipe. Enquanto isso, você se surpreende com uma pessoa nova trabalhando na mesa ao lado, já que o gestor esqueceu de apresentá-la à equipe, e no dia seguinte fica sabendo por um cliente que um colega seu de trabalho foi demitido há mais de dois meses – ou porque o RH não comunicou a demissão, ou porque você mesmo não teve tempo de ler o último comunicado enviado. Acho que o guru Peter Drucker foi muito conservador ao afirmar que 60% dos problemas das empresas são provenientes da ineficácia da comunicação.

Daniel Goleman, em seu livro Foco, publicado ano passado, alerta que nos tornamos uma sociedade sem concentração, mas que a nossa capacidade de realizar tarefas com excelência é diretamente proporcional ao nosso poder de foco. Ou seja, temos no mínimo um problema de produtividade, sem querer citar o ciclo vicioso que muita gente já adotou, de recorrer a um comprimidinho de tarja preta para dormir à noite e de se entupir de cafeína, no dia seguinte, para acordar, pois não consegue nem focar e nem descansar por conta própria. Acabamos nos tornando seres eternamente atraídos pelas distrações cognitivas do dia a dia, nos afastando das atividades que realmente importam, nos distanciando das outras pessoas. Uma pesquisa da Universidade da Califórnia concluiu que, a cada interrupção, como um “plin” que acusa uma nova mensagem no WhatsApp, nosso cérebro demora em média 23 minutos para voltar a se concentrar na tarefa que estava sendo desenvolvida. Em um cenário como esse, fica difícil conseguir se comunicar com o outro.

Você não pode achar que sabe se comunicar só porque emite som e aprendeu a digitar rápido no touchscreen do celular. Uma comunicação eficiente pressupõe principalmente ouvir o outro, em vez de já ter uma resposta na ponta da língua, ou um texto de 140 caracteres pronto para ser disparado antes mesmo do início da interação. Para que haja mudança no ambiente organizacional, é preciso que as pessoas mudem. Comece por você. Deixe um pouco de lado o smartphone, em vez de digitar uma mensagem. Levante e vá até a mesa do colega para discutir os detalhes da reunião de amanhã. Tente ouvir mais, recupere a genuína curiosidade sobre o outro, seja ele o seu gestor, o seu par no trabalho, o seu filho, ou o seu parceiro de vida. Pense na forma que você vai usar para transmitir uma determinada informação; as palavras têm vida própria e devem ser bem escolhidas. Todos nós temos em comum as 24 horas do dia. A diferença é o que cada um faz com elas.

Jacqueline Sobral é jornalista, doutoranda em educação pela PUC-Rio, mestre em Comunicação e Práticas de Consumo pela ESPM-SP, palestrante e professora do IBMR e da Unicarioca nas áreas de comunicação, marketing e jornalismo

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