Vai ou fica?

de Gumae Carvalho em 19 de junho de 2009

Fase final de um processo de seleção. É chegado o momento da grande entrevista, aquela que pode decidir seu ingresso, ou não, na companhia. O executivo com o qual você possivelmente irá trabalhar pergunta sem dó nem pena: “Se o contratarmos hoje e amanhã uma grande empresa chamá-lo para trabalhar, o que você faria? Você iria nos deixar?”.

Essa situação ocorreu, recentemente, com um amigo. Antes de se lamentar se a resposta dada agradara ou não ao executivo, ele se lamentava pelo fato de muitas empresas exigirem tamanha fidelidade. “Só no casamento”, disse-lhe. “E olhe lá”, respondeu-me.

Essa situação relatada parece a assinatura de um contrato pautado pela obrigação. “Já que o aceitamos aqui, aqui você deve ficar até morrer.” De fato, isso acontece, uma vez que os números de acidente de trabalho são elevados… Saindo do humor negro, fico pensando que questões como essas muito mais atestam do que testam:
não testam o nível de engajamento, mas atestam a presença de um certo nonsense em algumas companhias.

Pautar-se pela obrigação significa que uma pessoa é levada a fazer algo, não de uma forma irresistível, mas pelo simples fato de que se não o fizer sofrerá consequências piores. Há um quê de constrangimento nisso, que anula nossa capacidade de escolha e me lembra assédio moral.

Mas existem outras bases de contrato, como o engajamento, que pressupõe dar-se (ou qualquer coisa sua) em penhor. Há, nesse contexto, um clima de garantia, em que as partes reforçam votos de confiança. “Você confia quando eu digo que minha empresa vale mais a pena do que a outra e que aqui vamos cumprir o prometido. E, mais que isso, faremos de tudo para você se apaixonar por nós!”

Ah! Paixões… outra base de contrato. Durante muito tempo, muitos filósofos não as viam com bons olhos. Julgavam ser uma fraqueza, algo que demonstrava a passividade do ser humano, impedindo a razão de se manifestar. Somos levados a adorar, a amar, a ir atrás de alguém ou de algo – mesmo contra a razão.

Algumas empresas, no entanto, sabem usar a paixão. Até parece que leram o que Hegel escreveu em Filosofia do Espírito : “Nunca nada de grande foi cumprido ou poderia sê-lo sem as paixões. É uma moralidade morta, e mesmo frequentemente uma moralidade muito hipócrita, a que se eleva contra a paixão pelo simples fato de ser uma paixão”.

Qual seria a melhor resposta para a pergunta acima: a baseada na obrigação, no engajamento ou na paixão? Se a empresa for obrigada a reduzir custos e tiver de optar entre o funcionário (prestes a ser contratado) e outro com salário menor, quem vai embora? Se a empresa não se engajar para entregar o que ofereceu, tem o direito de cobrar essa permanência? E se a empresa for apresentada para outra pessoa e se apaixonar por ela no dia seguinte?

Não foram essas as respostas que meu amigo deu. Ele disse que aceitaria ir para outra empresa e explicou-me o porquê: “Porque a empresa demonstrou uma elevada baixa-estima corporativa. Se ela se sentisse boa, realmente, não teria medo de perder talentos. E por falar nisso, tentei animar o meu interlocutor ressaltando que, se uma grande organização me chamasse no dia seguinte, ele deveria ficar feliz e satisfeito por saber identificar excelentes profissionais.” É, faz sentido.

Gumae Carvalho é editor da revista Melhor RH

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